sexta-feira, 2 de setembro de 2011

"ABAPURU"- TARSILA DO AMARAL

Em 1928 Pinta a Obra mais Conhecida de Tarsila que é o"Abaporu", que foi criada por Tarsila para dar de presente de aniversário a Oswald que se empolga com a Tela e cria o movimento"Antropofágico".






Antropofagia

Definição
No dia 11 de janeiro de 1928, a pintora Tarsila do Amaral oferece a Oswald de Andrade (1890 - 1954), como presente de aniversário, uma de suas recentes pinturas, sem saber que ela viria a ser a propulsora de uma das mais originais formulações teóricas sobre a natureza específica da arte moderna brasileira. Enquanto contemplava aquele estranho homem pintado por Tarsila, de pés enormes fincados na terra, cuja pequena cabeça parece apoiar-se melancolicamente em uma das mãos, cercado por um ambiente seco e quente, tendo como testemunha apenas o céu azul, o sol e um misterioso cacto verde, Oswald de Andrade foi indagado por seu amigo e escritor Raul Bopp (1898 - 1984), que o acompanhava na observação: "Vamos fazer um movimento em torno desse quadro?".Abapouru 1928, que em tupi-guarani significa "antropófago", foi o nome escolhido para aquela figura selvagem e solitária.
Funda-se em seguida o, Clube de Antropofagia, juntamente com a Revista de Antropofagia, em que é publicado o Manifesto Antropófago escrito por Oswald de Andrade como o cerne teórico do movimento nascente, que se dissolve com a separação entre ele e Tarsila, em 1929. Com frases de impacto, o texto reelabora o conceito eurocêntrico e negativo de antropofagia como metáfora de um processo crítico de formação da cultura brasileira. Se para o europeu civilizado o homem americano era selvagem, ou seja, inferior, porque praticava o canibalismo, na visão positiva e inovadora de Andrade, exatamente nossa índole canibal permitira, na esfera da cultura, a assimilação crítica das idéias e modelos europeus. Como antropófagos somos capazes de deglutir as formas importadas para produzir algo genuinamente nacional, sem cair na antiga relação modelo/cópia, que dominou uma parcela da arte do período colonial e a arte brasileira acadêmica do século XIX e XX. "Só interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago", bradou o autor em 1928.
Em linhas gerais, o Modernismo da Semana de 22 caracteriza-se por uma dupla vocação: atualizar o ambiente artístico brasileiro, colocando-o em contato com as diversas linguagens das vanguardas européias e ao mesmo tempo voltar-se para apreensão do Brasil, em um projeto consciente de criação de uma arte brasileira autônoma. Uma proposta de equação entre as duas inclinações (internacionalista e nacionalista) já se encontra no centro do Manifesto Pau-Brasil, 1924, de Oswald de Andrade, no qual o autor resolve o problema da tensão entre a cultura civilizada e intelectual do colonizador e a nativa e primitiva do colonizado mediante um "acordo harmonioso que se produziria na realidade, graças a um processo de assimilação espontânea entre 'a floresta e a escola' ", como notou Benedito Nunes.
  Nota -se que Oswald de Andrade exerce esse mesmo procedimento antropofágico ao transformar o estigma de canibal em qualidade, afirmando-o positivamente como constituinte da essência desrecalcada brasileira. Naturalmente não é o primeiro a utilizar a imagem do antropófago. Esta é corrente na literatura européia dos anos 1920, valorizada sobre o pano de fundo da redescoberta das culturas primitivas da África, América e Oceania pelas vanguardas artísticas. A temática do canibalismo comparece em autores tão diversos quanto o poeta futurista Filippo Marinetti, o pintor surrealista Francis Picabia, que edita sua revista Cannibale em 1920, o poeta Blaise Cendrars, entre outros. Certamente o autor dialoga com o movimento europeu, mas confere a imagem originalidade quando a transforma em metáfora de um procedimento criativo, ativo e crítico, gerador de uma arte brasileira moderna e autônoma.
Se em 1928 o escritor não abandona por completo esse ideal utópico de síntese entre o modelo europeu e a experiência do primitivo, acrescenta-lhe, no entanto, o primitivismo como arma crítica seletiva, na imagem do selvagem que devora e assimila apenas o que interessa, destruindo todo o resto. Proclama - contra todas as "catequeses", todos os importadores de consciência enlatada, o Padre Vieira, as elites vegetais, a verdade dos povos missionários, o índio de tocheiro, Anchieta, Goethe, e a corte de D. João VI e, por fim, a realidade social, vestida e opressora - a "realidade sem complexos, sem loucura, sem prostituição e sem penitenciárias do matriarcado de Pindorama". Pois se é inevitável a assimilação das conquistas da civilização moderna, é preciso que o brasileiro se eleve à cultura "desde que conserve as qualidades bárbaras das origens bugre e africana", como observou Mário Pedrosa.
No caso de Tarsila do Amaral, o procedimento poético de sua pintura, dita antropofágica (1928 aca.1929) - que além do Abaporu, compreende também  O Ovo [Urutu].1928, A Lua, 1928, Floresta, 1929 Sol Poente, 1929, Antropofagia, 1929, entre outras, e da qual  A Negra, 1923 é considerada precursora - caracteriza-se pela "desarticulação da forma construtiva", mediante a submersão na "materialidade cultural" brasileira. Sem esquecer o aprendizado moderno de redução formal e planificação do espaço pictórico, a artista cria, com o uso estilizado de formas arredondadas e cores emblemáticas (principalmente tons fortes de amarelo, verde, azul, laranja e roxo), um alegre universo "selvagem", que se liga a um mundo onírico, mágico (das lendas indígenas e africanas), primitivo, profundamente enraizado na cultura popular brasileira. Entretanto, vale lembrar, seguindo a argumentação de Sônia Salzstein, que a fase "antropofágica" de Tarsila não deve ser considerada como simples ilustração de uma teoria. Seu próprio desenvolvimento artístico a teria levado a esse momento de relação crítica com o aprendizado francês, de certa forma antevendo plasticamente a plataforma antropofágica oswaldiana.
A partir dos anos 1930, com o agravamento da situação econômica e social com o craque da Bolsa de Nova York em 1929, do qual Oswald de Andrade é uma das vítimas, e a instauração do período getulista (1930-1945), a questão do "moderno" como tensão entre nacional e internacional toma outros rumos, sendo discutida em termos diversos, pelo menos até o fim dos anos 1960. Oswald renega o "sarampão antropofágico" durante os anos 1930, voltando a ele somente no fim da década de 1940. A idéia de antropofagia como procedimento estético só é conscientemente retomada, em meados dos anos 1960, montagem da peça O Rei da Vela, pelo Teatro Oficina, e o movimento tropicalista de 1967-1968. A institucionalização desse conceito dá-se em 1998 quando a 24ª Bienal Internacional de São Paulo, de maneira discutível, é organizada segundo o tema "Antropofagia e Histórias de Canibalismo", propondo a construção de uma outra história mundial da arte, ou seja, uma história que adotasse um ponto de vista não-eurocêntrico. Propõe-se então a atualização e, curiosamente, a internacionalização da antropofagia oswaldiana.



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